Continuando que a discussão com o Tiago sobre a IVG, gostava hoje de abordar esta questão sob outro prisma. Para mim este é uma das questões basilares nesta temática e que ainda não vi discutida neste tema, talvez por pudor.
Quando falamos de IVG, estamos antes demais a falar de sexo! Não existe IVG sem sexo. É um facto incontornável. Portanto, eu julgo antes demais qualquer outra discussão (sobre o que é a vida, sobre se a gravidez é ou não um acto opcional ou se é algo respeitante ao individuo ou não) teremos de definir o campo do sexo.
Antes demais comecemos pela parte biológica (neste caso minimalista): é um acto fisico! Mais do que isto é complicar a definição.
Posto isto julgo que o sexo deve ser visto subjectivamente, isto é, cada pessoa determina o que realmente é para ela. Julgo que numa sociedade livre, ninguém tem a ver com a noção que cada um tem sob esta temática.
Para mim só diz respeito ao(s) envolvido(s). Na masturbação é só o próprio, na relação monogamica é o próprio e o seu parceiro ou parceira, e em relações poligamicas ao próprio e aos diversos parceiros.
E se é verdade que durante muitos anos a visão de sexo estava estritamente relacionada com a procriação, avanços recentes (pilula, preservativo, pilula do dia seguinte, etc...) quebrou essa relação. Portanto julgo que é tão legitimo alguém encarar o sexo como forma de procriar, ou alguém conceber o sexo completamente fora do conceito conceptivo do mesmo.
Ora acontece que existe um grande problema para estes ultimos, é que biologicamente ainda é impossível escaparmos ao risco de gravidez. É algo que por enquanto foge ao nosso controlo, por mais precauções que façamos não podemos evitar esse risco.
E é neste contexto que aparece o IVG. Eu diria que é a medida que está no limiar. Isto é, é a medida que permite que uma pessoa não tenha uma nova vida se não pretender e que ainda não afecta mais ninguém que não ela própria.
Pode ser questionável? Sim! Podem as pessoas não concordar? Sim! Mas é inaceitável que a sociedade se pronuncie sobre qual a "moral" mais correcta. E é aqui que eu não te compreendo, Tiago. É que independentemente de todas as opiniões diferentes que possamos ter, os pontos de vista, as moralidades opostas que tenhamos, a verdade é que ser-se liberal é isso mesmo: construir uma sociedade em que todas estas diferentes visões existem e co-existem, e isso era algo que a lei anterior não permitia. Podes ser contra a pratica do IVG, mas dificilmente poderás defender a sua proibição sem destruires a coerência da tua doutrina liberal.
2 comentários:
Sabes, stran, sempre me espantou um pouco que se elabore tanto à volta deste assunto que a mim me parece exclusivamente do âmbito do ‘indivíduo’, neste caso indivídua. Para mim as coisas são muito simples, antes de tudo e como diz a Agustina Bessa Luís, ‘é um assunto de mulheres’.
Claro que dito assim é muito redutor, também é um assunto de homens, dos pais, mas os planos não se equivalem porque as consequências não se equivalem.
Não me comove minimamente o argumento de não haver diferença entre o matar e o não deixar viver. Só para a religião é que a alma é insuflada no momento da concepção, a ciência tem outra ideia sobre o ser humano.
Mas o que verdadeiramente me faz impressão é como é que a sociedade, um conjunto de pessoas que não me conhece de lado nenhum, nada tem a ver com a minha vida, nada sabe sobre mim, não me vai dar uma mão em alturas complicadas, pode ter a pretensão de me impor uma vida que eu ou não quero, ou não posso ter de momento ou não me interessa de todo, só porque num momento ou outro, numa situação privadíssima que só a mim e a outro diz respeito, aconteceu um qualquer acidente imprevisto.
Os moralistas irritam-se muito com esta frase, mas é mesmo o que penso: na minha barriga mando eu.
Enfim, nada disto é pessoal, há sempre a ideia de que apenas nos empenhamos no que nos toca directamente. Não é assim, mas antes uma questão de princípio, como tantas outras.
Desculpa o atraso no meu comentário mas isto anda dificil.
Concordo totalmente contigo.
Mais, julgo que esta discussão é interessante porque, à volta deste tema, discutimos que conceito de sociedade é que defendemos.
Ou seja a noção de uma sociedade intrusiva ou não intrusiva.
Ou seja o modelo de sociedade entre conservadores e progressistas/liberais. Que é uma velha e eterna contenda!
E mandas bem! Na tua barriga como em todas as outras partes do teu corpo!
"Enfim, nada disto é pessoal, há sempre a ideia de que apenas nos empenhamos no que nos toca directamente. Não é assim, mas antes uma questão de princípio, como tantas outras."
É verdade, por exemplo a nível pessoal, eu não sei se fosse mulher o que decidia numa situação, e já conheci pessoas que optando (concretamente) por não abortar (na altura que ainda era proibido) defendem acerrimamente a alteração que aconteceu.
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