Dei-me por estes dias a discutir o radicalismo e a forma de o evitar. Muitos argumentos foram dirimidos, exemplos foram dados e chegou-se a algumas conclusões. Tal debate levou-me no entanto a pensar em algo um pouco paralelo: porque é que o radicalismo tem muitas vezes suporte nas bases mais carenciadas?
Tipicamente responde-se com a falta de cultura ou conhecimento. É a resposta chapa 5 para resolver este dilema. Uma forma simples (e diria radical) para explicar este facto.
Mas, pessoalmente, é uma resposta que não me deixa satisfeito. E quando não estou satisfeito vou à procura de mais respostas... E de neurónio em neurónio fui ter à fome - Ok, isto tem a ver com o que escrevi anteriormente, não percam a paciência que já vão entender.
Já alguém sentiu fome? Eu já, e acredito que quase toda as pessoas já o sentiu. Não sei se acontece convosco, mas quando começo a ficar com fome começo a ficar mais irritadiço. Fico mais nervoso e muitas vezes mais brusco. Se por acaso a fome começar a apertar ainda mais, então os meus pensamentos começam a se concentrar apenas numa coisa: comida!
Ora se tiver com fome e tiver num restaurante existe outra coisa que me acontece: não consigo escolher. Olho para o menu e procuro a resposta mais simples que satisfaça a minha necessidade. Se tiver muitas opções, e forem todas equivalentes, pura e simplesmente não consigo escolher. Se alguém escolher por mim, optimo! Trata-se da opção mais eficiente para satisfazer esta necessidade.
Nestas alturas quero lá saber de filosofias, ou que quer que seja, quero é comer.
E isto não é de estranhar. Afinal numa situação "selvagem" seria natural que o meu corpo reagisse desta forma. A procura de comida é possívelmente a actividade mais básica que um animal executa. Nesse sentido tem lógica que numa situação de fome, o nosso corpo se concentre na actividade de procurar comida e procure a solução mais simples e eficiente para o fazer. Se tivesse que dizer, todo o nosso corpo (mente incluida) está programada para mudar o comportamento nesta situação, tal é a importância de ter sucesso nesta actividade.
Mas será que ainda faz sentido falar-se em fome na sociedade de abundância como a nossa?
Antes demais a sociedade de abundância é também uma sociedade desigual, pelo que mesmo na nossa abundância existe muitas pessoas passam fome, ou pelo menos passam um periodo de fome ao longo do dia. Depois, porque na minha opinião, não é apenas a fome que desperta actualmente este instinto de sobrevivência. Por exemplo um orçamento limitado, obriga uma pessoa diariamente a ponderar diversas opções. A incerteza de futuro também.
Tudo isto são caracteristicas que as camadas mais pobres têm. Neste contexto - fome, mente ocupada e cenário de incerteza - o que uma pessoa quer são respostas simples e eficientes (tal como no caso do menu).
Ora é aqui que o radicalismo entra. Se existe algo que os radicais fazem com uma elevada mestria é simplificar o mundo e as opções. Qualquer radical (de que credo for) torna o mundo simples - branco ou preto - pelo que, se as camadas mais desfavorecidas percepcionarem que lhes é benéfico, não vão ponderar outra opção: escolhem a mais simples e eficiente para eles.
É por isso que o radicalismo tem tanto suporte nas camadas mais desfavorecidas e é neste campo que os moderados vão ter de aprender a simplificar o seu discurso. Com a crise mundial, o empobrecimento da população e o desaparecimento da classe média, compete aos moderados não permitir que se cometam os mesmos erros que os radicais cometeram no passado.
O seculo XX mostrou-nos que a unica altura em que a solução dos moderados era simples e entendível por todos foi depois de uma grande tragédia ter acontecido devido aos extremismos europeus. Espero que os moderados do século XXI tenham aprendido a lição...