ENSINO ESCOLAR: METAS E MEDIDAS

O estado deplorável do sistema escolar nacional é do conhecimento público, e cada um consegue apresentar diversos exemplos ilustrativos deste fenómeno. Vários remédios foram propostos, uma grande parte dos quais, incluindo as recomendações das entidades europeias, cita a necessidade de transformar o ensino num conjunto de prestadores de serviços educativos, de modo que os alunos e os seus pais possam escolher aquele prestador que proporciona um serviço educativo melhor.

Todavia, todos estes remédios falham em vários pontos importantes, nomeadamente:

1. O principal objectivo do sistema escolar é de proporcionar ao aluno as ferramentas necessárias para a sua aprendizagem futura, tanto no ensino superior, como ao longo da sua via, além de conhecimentos e competências concretas.
2. Um sistema escolar, correctamente construí­do, deve proporcionar uma formação adequada (equivalente a uma avaliação objectiva de [???]) a um aluno médio.

As principais ferramentas do nosso aluno são o Português, e a Matemática, sendo esta última a lí­ngua comum das ciências exactas e tecnologias. As notas médias dos exames nacionais destas duas disciplinas são de 7, o que mostra uma incapacidade do nosso sistema escolar de proporcionar as ferramentas essenciais ao aluno médio. Não devemos esquecer ainda que a nossa taxa de abandono escolar é de 40%, assim, o sistema escolar consegue ensinar, com uma grande ajuda dos explicadores, apenas 1/5 dos alunos que entram no primeiro ano da escolaridade.

Analisando objectivamente os currí­culos escolares, concluí­mos que estes são suficientes, do ponto de vista de conhecimentos e competências que o aluno deveria obter. O problema, então, não está no que estamos a ensinar, mas sim no como.

Olhando atentamente para o ensino primário, detectamos duas falhas metódicas graves.

A primeira é a aposta no método global (visual) de ensino de leitura. Este método para sua implementação correcta necessita de professores excelentes e bem preparados, pois na consequência de erros comuns na sua implementação os alunos não aprendem a ler fluentemente em tempo útil, o que consideramos ser o segundo ano da escola primária (primeiro ciclo). As tentativas falhadas dos últimos 20 ou 30 anos de usar este método mais que justificam a sua proibição oficial, pois na consequência do seu uso cerca de 80% dos nossos alunos não aprendem a leitura atempadamente, com consequências graves para todo o seu percurso escolar.

A segunda é a aposta no pensamento crí­tico dos alunos, em detrimento de memorização sistematizada de conhecimentos, e em detrimento do desenvolvimento de capacidade de memorização. Há 20 ou 30 anos, apostamos na criação de um ensino mais democrático, baseado no desenvolvimento da capacidade de pensamento crí­tico, eliminando os exercí­cios para desenvolvimento da memória dos currí­culos de todos os anos. Esta aposta falha em dois aspectos. Em primeiro lugar, um aluno tí­pico da escola primária (primeiro ciclo) não tem capacidade de pensamento crí­tico, aceitando de bom grado tudo que lhe seja dito pelos adultos. Mesmo que este aluno aparente uma capacidade razoável de pensamento crí­tico, na realidade apenas interpreta as dicas do professor, dadas voluntária ou involuntariamente. Entretanto, o pensamento crí­tico do aluno pode e deve ser desenvolvido, mas gradualmente, e nos alunos já com idade mais avançada, e, consequentemente, com capacidades mentais mais desenvolvidas. Em segundo lugar, abstendo do desenvolvimento da capacidade de memorização sistematizada do aluno, a escola não aproveita deste recurso que o aluno já possui, e que deve ser desenvolvido, desde logo, para proporcionar as bases para o próprio pensamento crí­tico, pois não há lugar para qualquer pensamento sem recurso aos conhecimentos memorizados.

Assim, para começarmos a reconstruir a nossa escola, devemos eliminar, e o mais depressa possí­vel, as duas falhas metódicas mencionadas, sendo certo que os exercí­cios de memorização sistematizada devem ser reintroduzidas em todas as disciplinas de todos os ciclos, e não apenas na escola primária. Devemos admitir ainda que o processo de reconstrução vai ser demorado, pois as alterações introduzidas hoje não trarão grandes vantagens para os alunos que se encontram nos ciclos preparatórios e na escola secundária. Podemos tentar ensinar a estes alunos, mais uma vez, aquilo que não aprenderam quando deviam ter aprendido, embora sem grande esperança de sucesso.

Desenvolvemos estas ideias numa forma mais completa na nossa análise, publicada no nosso blog: http://educacao-em-portugal.blogspot.com/

José Carrancudo, professor e educador

3 comentários:

Stran disse...

Antes demais gostaria de agradecer José Carrancudo este excelente post.

Gostaria de referir também que por problemas de mail todas as palavras com acento foram alteradas pelo hotmail pelo que me foi impossível modificar uma delas.

Quem quiser intervir através de posts poderá fazê-lo para o mail stran_ger69@hotmail.com

Fly disse...

Estão aqui algumas das medidas que deveriam ser implementadas. Só que o objectivo do governo não é tornar as cranças mais inteligentes e criticas é precisamente o contrário, por isso todas as medidas que têm sido aplicadas ao longo dos anos têm sido excelentes na medida que estão a fazer um óptimo trabalho ao tornar os alunos menos participativos na sociedade, mais burros e mais facilmente manipuláveis para que aqueles que têm acesso a uma boa educação (uma pequena élite) possam governar a seu bel-prazer.

abraço

Stran disse...

O mais difícil de uma educação é ensinar a raciocinar...